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1 16/11/2017 18:12

Durval Pereira da França Filho*

O dia 31 de outubro de 2017 assinalou a passagem dos 500 anos do segundo grande cisma do cristianismo: a Reforma Protestante. Nesse contexto, percebe-se que o número dos novos evangélicos tem crescido de maneira considerável. Mas também vem crescendo o número de muçulmanos, espíritas, agnósticos e ateus. Em meio a essa migração dentro do cristianismo, ao crescimento do Islã, a despeito do terrorismo, e ao crescimento daqueles sem religião, vai aqui uma pergunta: Deus existe?

Se você acredita que Deus existe, então prove. Não, você não pode provar, como também não pode provar o contrário. No panteão dos sem Deus, os mais evidentes são os ateus e os agnósticos.

Ateu é aquele que nega a existência de Deus, e o termo vem do grego a = não, sem: + Theos = Deus. Os especialistas fazem distinção em alguns tipos de ateus: existencialistas (Jean-Paul Sartre), marxistas (Karl Marx), psicológicos (Sigmund Freud), capitalistas e comportamentalistas (B. F. Skinner). O foco de sua argumentação é a negação.

Agnóstico é o que desconhece os meios para saber se Deus existe, bem como outras realidades metafísicas. O termo também vem do grego a = não + gnoses = conhecimento, ou seja, Deus é incognoscível, não se pode ter certeza se Ele existe ou não. O foco de sua argumentação é a dúvida. Mas, independentemente das classificações, os adeptos do ceticismo são encontrados nos meios de comunicação e, principalmente, nas universidades.

Charles Darwin (1809-1882), naturalista britânico, é um exemplo típico de agnóstico. Através de suas pesquisas e observações sobre a variabilidade das espécies, elaborou a doutrina da evolução por meio de uma seleção natural, como paradigma para explicar a origem da vida, sem evidências da ação divina.

Já Friedrich Nietzsche (1844-1900), alemão de origem judaica e formação luterana, filósofo e filólogo, tem sido considerado “o mais cruel e vigoroso ateu da história”. Dizia que para ele Deus estava morto, pois não conseguia acreditar em “um Deus que quer ser louvado o tempo todo...”. Assim, a sua crença na morte de Deus era subjetiva, na cosmovisão do homem ocidental.

Sigmund Freud (1856-1939), neurologista e psiquiatra austríaco, sempre se considerou ateu, embora de origem e educação judaicas. Para ele, “Deus é uma concepção humana nascida no inconsciente...”, e “a fé em Deus não passa da projeção de fortes desejos e necessidades internas”. Costumava afirmar que não tinha o temor de Deus e que, se algum dia o encontrasse não pretendia se entregar. Mas quase se entregou.

Já o crítico literário britânico C. S. Lewis ou Clive Staples Lewis (1898-1963), também ateu, tinha em Freud a sua inspiração. Na universidade, C. S. Lewis teve certeza de que “religião é coisa para criança”, e as igrejas eram verdadeiras creches para aqueles que não conseguiram crescer e se libertar. Freud morreu de câncer do palato, afirmando ser ateu até o fim dos seus dias, mas sua correspondência está cheia de expressões como “graças a Deus”, “se Deus quiser” e similares. Foi a morte do mestre que levou C. S. Lewis a ser criança de novo e a voltar para a creche, para Deus.

Para Bertrand Russel (1872-1970), filósofo e matemático britânico, ateu, “a religião nasce do medo” e torna as pessoas subservientes e a crença em Deus não conduz à felicidade.

O que pensam os modernos Richard Dawkins (1941), biólogo inglês, e Stephen Hawking (1942), astrofísico e cosmólogo? A fé em Deus é um “absurdo altamente perigoso”, porque a probabilidade de que Deus exista é ínfima (Dawkins). A crença em Deus é incompatível com a ciência (Hawking).

Francis Collins (1950), biólogo e geneticista norte-americano, foi diretor do Projeto Genoma Humano. Ateu convicto até os 27 anos, seguiu na contramão da tendência pós-moderna entre os cientistas: foi na universidade que ele se converteu ao cristianismo. A partir daí, vem discordando das teorias de Daniel Denneth, Richard Dawkins e outros colegas ateus, e afirma categoricamente que “a ciência não exclui Deus”.

Leandro Karnal (1963), historiador brasileiro, professor da Unicamp e ateu convicto, faz apologia à Bíblia como o livro mais influente da humanidade, livro que ele diz ler “quase diariamente” e do qual destaca o livro de Jó e o coloca entre os dez que mais influenciaram sua vida. É essa Bíblia que Leandro Karnal já leu muitas vezes, que afirma no Salmo 19:1: “Os céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia as obras das suas mãos”.

Então, para ser ateu é preciso ter mais fé do que para ser religioso, porque a crença cristã se fundamenta na Bíblia e nas evidências da natureza; a muçulmana (sem terrorismo) se fundamenta no Alcorão; o judaísmo se fundamenta na Torá (Velho Testamento); mas o fundamento ateísta é a negação, o niilismo, o nada. “Viemos do nada e vamos para o nada; no meio, resta apenas a angústia” era como pensava o filósofo francês Jean Paul Sartre (1905-1980), de ancestralidade cristã que se desencantou com a religiosidade aparente de sua família.

Augusto Cury, médico psiquiatra paulista, o escritor brasileiro mais lido nos últimos dez anos, autor da Teoria da Inteligência Multifocal, assim com C. S. Lewis, foi um dos grandes ateus que também voltou à “creche”, a Deus... mas ele afirma que religião pode ser fonte de doença e de saúde mental, a depender da forma como é praticada. “A intolerância é um câncer na sociedade e isso vai totalmente contra o que Jesus vivenciava...”, afirma Cury.

A falta de Deus na vida das pessoas pode contribuir para o aumento da violência, do preconceito, da intolerância. Mas o grande problema não decorre dos céticos, por qualquer razão. Os responsáveis pelo grande aumento dos descrentes são os ditos crentes, que não vivem de acordo com a fé que professam em Deus. Vivem como se Ele realmente não existisse, o que tem contribuído para o desencantamento de muitos. Por trás de cada conversão ao ateísmo, existe uma frustração, uma mentira, um engano, um desencanto motivado por religiosos de ontem e de hoje.

Aqui na região conheço muitas pessoas que são ou eram descrentes, por causa dos motivos acima e ainda por outros que eles mesmos não sabem: seguem na onda do modismo, como aconteceu com os grandes movimentos carismáticos a partir da década de 1970.

L. Carlos (ateu comportamentalista) decepcionou-se com os diversos segmentos do cristianismo e perdeu o encantamento, como aconteceu com Jean Paul Sartre. Marcelo (discípulo de Karl Marx) acredita que uma ética sem Deus seja possível porque, de certa forma, a religião anestesia a alma do povo. Élio, burguês, diz não crer em nada, o que é um contrassenso, porque se você não crê em algo, forçosamente crerá no seu oposto. Eliomar (agnóstico) não acredita seja possível o conhecimento de Deus, assim como pensava Charles Darwin. Antônio, C. Eduardo e T. Carlos, agnósticos, levam o assunto no deboche, com um leve toque do deísmo voltairiano. R. Jorge, também burguês, não acredita em Deus, mas pede orações nos momentos conturbados, algo que só Freud explica. Edneia, influenciada pelo meio, se tornou ateia, por que “Deus não ajuda a ninguém”. O que se verifica é que todos eles têm comportamentos diferenciados para justificar o exercício de sua convicção niilista.

Para Aristóteles (384-322 a. C.), o filósofo de Estagira, Deus é o motor do universo, fonte de toda ação, instigador de todo pensamento, primeiro e último. Essas ideias influenciaram, séculos depois, o pensamento de São Tomaz de Aquino (1225-1274), o “Príncipe da Escolástica”, cuja doutrina procura a autonomia da natureza e da razão, em harmonia com a fé. Entendia ele que “para os que têm fé, nenhuma explicação é necessária; para os sem fé, nenhuma explicação é possível”. Seu amigo São Boaventura também conclui, com base em Isaías 7:9, que a ideia é “crer para compreender e não compreender para crer.”

Nesse emaranhado de conceitos e ideias, de crenças e descrenças, vale aqui um pensamento que se atribui ao deísta Voltaire (1694-1778): “Posso não concordar com o que você diz, mas defenderei até o fim o seu direito de dizê-lo”. Hoje, para crentes e descrentes, tolerância deve ser a palavra da vez, “sem arrogância, sem superioridade, sem presunção” como ensinava C. S. Lewis. Eu, particularmente, sou protestante adventista e meu credo se fundamenta na Reforma Protestante: Sola scriptura, sola gratia, sola fide, solus Christus, soli Deo gloria. É crer para compreender...

*Historiador

 

 

 


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