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1 19/07/2024 15:14

Investigação conduzida pela Polícia Federal com o Ministério Público do Estado detalha modus operandi do grupo criminoso

A investigação que culminou na prisão do capitão da PM de Salvador expôs a existência de uma organização criminosa com a participação de policiais militares da Bahia. Atualmente afastado das atividades e posto em liberdade na quarta-feira (17), o agora ex-subcomandante da 41ª Companhia Independente de Polícia Militar (CIPM) dos bairros Federação e Garcia, é apenas um entre pelo menos nove agentes suspeitos de repassar armas para facções.

O esquema veio à tona em maio, com a deflagração da "Operação Fogo Amigo", conduzida pela Polícia Federal (PF) com apoio do Ministério Público da Bahia (MP-BA).

Conforme demonstrado pelos investigadores, os suspeitos desviavam armas apreendidas em operações e compravam novos armamentos em lojas aliadas. Todo o material servia para abastecer o tráfico de drogas e também grupos criminosos que assaltavam bancos e tomavam o controle de cidades para cometer assaltos, seguindo a prática conhecida como "novo cangaço".


As armas não íam para os registros oficiais. Foto: Internet/ Meramente Ilustrativas

Em entrevista à TV Bahia, o delegado regional da Polícia Judiciária da PF-BA, Rodrigo Motta, disse que não há dúvidas de que os suspeitos estão "diretamente envolvidos com o crime". O investigador destaca que a atuação do grupo prejudica o próprio trabalho da corporação militar.

"Com as investigações, a gente pode falar que eram pessoas que, na verdade, estavam ali com a farda de policial, a carteira de policial, mas que, na verdade, atuavam como se fossem bandidos, fornecendo armamentos e munição para facções criminosas".

Os suspeitos começaram a ser investigados a partir da Operação Astreia, deflagrada em junho do ano passado na Bahia e nos estados de Sergipe e Pernambuco. O objetivo era desarticular um grupo criminoso especializado em tráfico de drogas e homicídios em Juazeiro.

Como lembra o delegado, a facção "atuava de forma muito violenta" para dominar a região, e iniciou uma guerra contra outros grupos. À época, o que mais chamou a atenção da polícia foi o aumento na taxa de homicídios, quando o Atlas da Violência, divulgado em junho, mostrou o município baiano como o quinto do país com maior taxa estimada de assassinatos em 2022.

Em meio a isso, o avanço das investigações apontou para a "possível existência de organização criminosa envolvida com o comércio ilegal de armas de fogo, munição e acessórios", especialmente na cidade. Foi assim que, quase um ano depois, a PF chegou aos 19 alvos da "Operação Fogo Amigo".


Delegacia da PF em Juazeiro/BA. Foto: Divulgação

Verificou-se que os suspeitos seguiam dois modus operandi. Quando se tratava de armamento usado, os PMs retinham as peças apreendidas em operações policiais e depois revendiam para organizações criminosas e para obter novos armamentos, os operadores do esquema usavam laranjas como CAC (Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador).
 
Em relação ao esquema para obtenção do registro abaixo, primeiro os envolvidos buscavam pessoas sem instrução, geralmente da zona rural das cidades e sem antecedentes criminais, para tirar o Certificado de Registro do Exército (CR), que é necessário para obtenção do título de CAC. Uma vez garantido o registro, a pessoa comprava o artefato em lojas especializadas, também ligadas ao esquema, depois registrava um boletim de ocorrência por furto e dava a arma como extraviada para que não fosse conectada ao comprador final. Se por alguma razão esse procedimento não fosse concluído, o número de série era raspado ou refeito.

Como o trabalho da PF mostrou, o alto índice de violência em Juazeiro não é aleatório. O município de 237.827 habitantes, o quinto mais populoso da Bahia, segundo o Censo 2022, é o ponto de partida da prática criminosa.


Cidade de Juazeiro, no norte da Bahia — Foto: Divulgação/Prefeitura de Juazeiro

É de Juazeiro que eram enviadas as armas e munições que abasteciam facções do norte ao sul da Bahia. Além de alimentar o tráfico local, as remessas costumavam ser enviadas para Salvador, Feira de Santana, Santo Antônio de Jesus e Porto Seguro no território baiano, e para Aracaju, em Sergipe, e Petrolina, em Pernambuco e o homem considerado como principal operador do esquema é um sargento da Polícia Militar pernambucana.

O sargento, sozinho, teria movimentado R$ 2,1 milhões entre 2021 e 2023. Com a quebra de sigilo telefônico do suspeito, os investigadores encontraram conversas que mostram suas negociações para venda de munições, revólveres, pistolas, rifles e até fuzis, sendo que muitos desses artefatos são de calibre restrito.

Um documento sigiloso obtido por uma emissora de TV detalha que essas munições eram compradas ilegalmente em lojas especializadas. Para isso, os operadores do esquema usavam certificados de registro de arma de fogo e CPFs de terceiros, inserindo informações falsas no sistema.


Armas e munições apreendidas pela "Operação Fogo Amigo", em maio deste ano. Foto: Imagens obtidas pela TV Bahia

Já as armas novas eram compradas nessas mesmas lojas em nome de laranjas. O passo seguinte era anunciar os itens em aplicativos de mensagens para revendedores, que recebiam comissão para negociar com os compradores finais, ou seja, os traficantes de drogas.

As três lojas supostamente envolvidas são a Universo Militar, em Juazeiro, a Sport Tiro, em Petrolina, e a Comercial Taurus, em Arapiraca, cidade de Alagoas. Todos os proprietários foram alvos de mandado de prisão preventiva na operação.

As encomendas chegavam aos destinatários por meio de transportadoras. Para garantir o transporte sem flagras, os suspeitos fingiam que o envio era de outros materiais.

Em uma encomenda interceptada pelos investigadores, por exemplo, Josenildo descreveu o produto como "rolamentos" na nota fiscal, precificado a R$ 200. Mas tratava-se, na verdade, de três pistolas e várias munições.

Também apresentado como um dos principais compradores e revendedores no esquema criminoso, um policial militar já identificado, transferiu aproximadamente R$ 700 mil para o proprietário da loja Comercial Taurus.

Em um das conversas entre os dois, o PM baiano encomenda mais de mil munições de diversos calibres, como as pistolas .40 e 9 milímetros, ao parceiro. As mensagens obtidas pelos investigadores mostram ainda que Gleybson movimentou mais de R$ 2,7 milhões em apenas uma conta entre fevereiro de 2021 e fevereiro de 2022.


Trecho das transações ilegaius realizadas entre os policiais. Foto: TV Bahia

O capitão e subcomandante da 41ª (CIPM) do bairro Federação foi o suspeito que mais transferiu dinheiro para o encarregado de desviar as armas. De acordo com o documento sigiloso do inquérito, o material adquirido era revendido a facções criminosas, especificamente o Bonde do Maluco, que acumula acusações de homicídios, assaltos e sequestros, além do tráfico de drogas na região.

Os pagamentos seriam feitos por intermediários do suposto líder do tráfico. Considerado um dos criminosos mais perigosos do estado, o suspeito atualmente cumpre pena no Conjunto Penal Masculino de Salvador.

A nova defesa do capitão e ex-subcomandante da 41ª CIPM disse que o acusado não irá se pronunciar. O policial passou a responder às acusações em liberdade.

Já a defesa de outro dos acusados disse que reúne "diversos elementos" para apresentar à Justiça. De acordo com o advogado Marcílio Rubens, a investigação foi precipitada.

"Você vai ver que os termos utilizados pela Polícia Federal são 'supostamente, provavelmente, tudo indica', fazendo perceber que não existe um elemento contundente sobre as suposições. Isso parte de movimentações financeiras que nós estamos juntando para demonstrar contratos anteriores feitos por redes sociais, e comercialização de produtos lícitos a exemplo de vermífugos, telefone celulares, eletrodomésticos, com diversas pessoas, inclusive compra de terreno".

Também procurada pela reportagem da TV Bahia, a defesa do policial de juazeiro acusado dos desvios disse que impetrou um pedido de habeas corpus e aguarda o posicionamento do Ministério Público Estadual (MP-BA) antes de se posicionar.

Quanto à defesa dos lojistas, a Universo Militar não quis se manifestar, enquanto as defesas daSport Tiro e da Comercial Taurus alegaram a inocência de seus clientes e se mostraram à disposição da justiça para prestar os devidos esclarecimentos.

Já a a Secretaria de Segurança Pública da Bahia informou que o cenário levou a pasta a fortalecer o trabalho das corregedorias.


Marcelo Werner, titular da Secretaria de Segurança Pública da Bahia. — Foto: TV Bahia

Titular da SSP-BA, Marcelo Werner destacou a criação de um grupo que tem como objetivo o combate a crimes praticados por policiais, a Força Correcional Especial Integrada (Force). "Já foram mais de 10 operações somente da Force, sem prejuízo das operações realizadas pelas corregedorias próprias", disse.

De acordo com o secretário, "respeitando todo processo legal, uma vez que haja desvio de conduta", a pasta deve investigar e levar os alvos à Justiça.

 

Fonte: G1 Bahia







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